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2018-2019
Aplicação de práticas de permacultura
A necessidade primária da regeneração do solo estabelecera-se perante o estado crítico de abandono, desflorestação e efeitos nocivos de um fogo no edifício do pátio contíguo: devido aos químicos libertados pelo incêndio, muitas das plantas já instaladas haviam sofrido graves queimaduras. Na mesma altura, fora também necessário resgatar muitas das que sobreviveram no jardim vizinho, por exemplo clematis e vinha-virgem, pedaços de pasto com equinácea amarela e outras flores, assim como alguma mobília. Muitos meses passaram até que o cheiro a queimado se dissipasse, em grande parte, através das primeiras plantações que absorveram uma parte dos agentes nocivos. Esperámos cerca de um ano para plantar flora comestível devido à possibilidade do solo conter ainda toxicidade. No rescaldo do incêndio, seguira-se a intervenção do novo proprietário, na sequência da tempestade em que duas das seis árvores tinham caído, mas quatro desapareceram. A acácia caíra sobre o sabugueiro ao centro do pátio, ferindo-o, mortalmente, expondo todas as suas raízes na vertical e excluindo qualquer possibilidade do resgate de ambos. O vidoeiro e outro dos sabugueiros restantes foram, prontamente, abatidos, em conformidade com o argumento de terem atingido a idade do seu término e de constituírem um risco para a segurança de estruturas e habitantes, sobrando apenas a macieira e o terceiro sabugueiro, num canto junto ao muro. O seu resgate da mesma intenção resultou apenas da nossa fortuita intervenção no momento, contra-argumentando, quer com a equipa de jardinagem no local, quer, telefonicamente, com o proprietário, que o exemplar não oferecia quaisquer dos riscos mencionados, aliás de acordo com a legislação vigente, mas chegáramos demasiado tarde para evitar o abate das outras duas árvores.
Em substituição das quatro árvores desaparecidas, na ausência de quaisquer planos de tratamento das raízes remanescentes e de reparação do ladrilhado rebentado, fora plantada uma única castanheira [Castanea sativa] em estado débil pelo novo proprietário, apresentando feridas profundas no tronco, até hoje em processo de cura. Foi, imediatamente, nos dias que se seguiram à plantação da castanheira que procedemos ao difícil e moroso processo de remoção das raízes da acácia que tombara na tempestade, não apenas enquanto efeito inevitável da mesma, mas também e, sobretudo, como consequência das condições da sua localização, bactérias nocivas, alterações climáticas, ausência de cuidados e outros factores. Esta árvore robusta encontrava-se numa posição frágil: existia a curta proximidade com outra da mesma espécie e um muro tinha sido construído sobre as suas raízes, interferindo, directamente, na circulação de ar e bloqueando o vento enquanto agente natural repelente de pragas alojadas, inicialmente, no tronco. O nível das águas de subsolo a baixar e o aparecimento de novos patógenos tinham contribuído, também, de forma significativa, para o sucedido, sendo que a total ausência de manutenção acelerara, sem dúvida, o processo de desvitalização e determinara a mortalidade precoce. Tratando-se a acácia de uma planta invasiva nesta região, a árvore revela a sua resistência contra agressões fazendo surgir vários novos rebentos ao longo das suas raízes, que, rapidamente, se haviam tornado visíveis, furando a pedra por todo o lado, não só ameaçando o desenvolvimento de muitas das futuras espécies, como fazendo também antever já altos custos de reparação de estragos causados. A sua extracção, tendo como prioridade o enfraquecimento das raízes, tornou-se um procedimento, absolutamente, imprescindível ao desenvolvimento de um espaço verde, na sequência da qual, ao longo de várias semanas, se removeram, quase na totalidade, as raízes de cerca de 3m a menos de um metro de profundidade, e se voltou a assentar o chão de pedra. Foi o barulho provocado por esta obra já em curso que proporcionou uma queixa por parte dos dois vizinhos dissidentes do projecto de ocupação, assegurando uma visita surpresa do senhorio actual ao pátio. Na sequência deste confronto, após verificação do sucesso da operação, aquele acabou por legitimar a ocupação, aceitando a nossa proposta de gestão autónoma do futuro jardim, se bem que informalmente e na condição da legislação de espaços verdes em contexto urbano continuar a ser cumprida. Tomámos então essa responsabilidade, garantindo, ao mesmo tempo, o levantamento do pagamento anual dos custos de manutenção do pátio, que remontavam à data a quantias variáveis entre os 80 e os 120€ por contrato de arrendamento. Caso contrário, a gestão ao encargo do próprio empresário, paga por todos os inquilinos, continuaria a ter sérias limitações de ordem ecológico-financeira: para além das árvores então existentes, seriam plantados apenas alguns arbustos, o ladrilhado, agora em estado de sítio, seria limpo de beatas e folhas, voltar-se-iam a utilizar químicos para eliminar os rebentos da acácia e ervas daninhas, a chuva seria o único alimento das futuras plantas, toda a matéria orgânica ali produzida seria levada para aterros e, uma vez por ano, seria feito o corte de controle. O solo a descoberto, mais contaminado e desflorestado ainda, não teria nunca a possibilidade de regenerar, quanto mais de alcançar os efeitos da Natureza hoje, claramente, visíveis.
O abate indiscriminado das árvores deu, assim, lugar à criação de um jardim baseado em princípios e técnicas de permacultura, abrindo a possibilidade para o surgimento de um ecossistema através da combinação de diferentes culturas em crescimento colaborativo: árvores, arbustos de bagas, flores, trepadeiras, cactos, bambus, vegetais e ervas; um sistema assente na partilha de diferentes bactérias, nos cuidados com o corte, na criação de composto nutritivo, na retenção de água e na colaboração das plantas pela subsistência, por oposição à sua concorrência. O caminho lógico para a implementação desta ilha, considerando a área na sua proporção, a quantidade de plantas adequadas e a utilização humana do espaço, resultou na criação de um projecto documentado, baseado na definição de sectores produtivos de massa verde com características de capacidade de recuperação de solos e da criação de vários nichos de insectos. Estabeleceram-se áreas para uma plantação consequente, compondo-se o desenho dos vários sectores dispostos em círculo, de acordo com a exposição solar, entre horticultura, composto, floresta, pasto, produtoras de pólen, o deserto dos cactos, ervas aromáticas, a mistura de todas estes e os canteiros elevados de legumes. A plantação das espécies altas nos canteiros em redor, concentrando no centro o pasto e determinadas flores, nomeadamente, através da utilização para o efeito da zona central de ladrilhado em losangos e da instalação de um primeiro canteiro elevado, permitiria a regularização da temperatura, a criação de sombra e a defesa aérea da exposição aos elementos, assim como a passagem livre, por todo o jardim, de insectos e bactérias colaborando na manutenção da saúde de toda a flora. Adicionalmente, seriam ainda criadas estruturas naturais para a permanência de insectos e aves. A proximidade para com as habitações, bem como outros factores tidos em conta, entre eles a proximidade com os contentores do lixo ou as áreas já reconhecidas de interacção social, viriam também a ser determinantes na composição do desenho final.
Para cumprir o objetivo de plantação foi preciso, inicialmente, continuar a melhorar a qualidade do solo com matéria orgânica e elementos naturais numa tentativa de imitação da Natureza, ainda que manejada e acelerada. À cobertura da superfície para criar humidade e evitar maiores perdas de nutrientes, seguiu-se então a selecção das plantas necessárias, de acordo com as suas características: durante dois anos, semeámos, resgatámos e transplantámos sobretudo plantas nativas de origem norte atlântica, bem como algumas espécies mais resistentes às alterações climáticas, capazes, no seu conjunto, de garantir a partilha dos recursos existentes. O passo vital foi introduzir determinadas bactérias que, em colaboração com as raízes das plantas, retêm os metais pesados e desempenham, continuadamente, o papel de transformar o solo.
No Verão de 2019, colocámos o mapa resultante do desenvolvimento do projecto de design de permacultura à disposição de todos os frequentadores do pátio, no qual incluímos a identificação de todas as espécies existentes à data.
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